A língua
emana traços insólitos de pensamentos não desenvolvidos. A mente divaga sobre
as histórias nunca contadas, escritas em um livro sem prefácio nem epílogo.
Lembranças escondidas em um emaranhado de opiniões, críticas e expressões
mal-acabadas. Contos e mais contos alimentados, durante anos, por resquícios de
antigos desejos. Desejos esses ainda latentes, vivos em cada personagem
retratado dentro dessa biblioteca de ideias.
A ponta do
lápis encosta no papel, e os filhos paridos pela insana imaginação ainda
ingênua da moça dos olhos castanhos saltam como coelhos apressados tentando não
perder a hora do chá. São mãos, bocas, sonhos, passos perdidos e olhares
encontrados misturados ao ritmo quente da valsa que tocava na noite passada.
Acordada
dentro de um sonho ela sublinha as possibilidades, e reflete sem qualquer
lucidez sobre os desdobramentos dessa história. É uma dança surda que nem o
próprio rei coração, retorcido entre seus átrios e ventrículos, - regente
superior desse universo sem era nem beira -, alcança a compreensão.
Por vezes é
como se todas as vontades já sentidas por aqueles olhos atacassem de uma só vez
a biblioteca numa explosão de sentimentos sem semelhante. Ela não cansa, mas
está exausta. Cada janta, ligação, passeio na lua, volta de balão e subida de
montanha suga parte de seus suspiros, acabando por deixá-la sem forças diante
das enormes vontades de uma vida inteira.
Olhar para
o céu já não mais basta. É preciso que o mar, a terra, a água, o fogo, a folha
que caiu daquela árvore naquele dia em Barcelona, o sopro do vento entre os prédios
e o toque suave dos amantes no banco da praça central se unifiquem e, juntos,
façam, de alguma forma, sentido. Onde foi parar o sentido descrito naquele
parágrafo?
Antes as coisas pareciam tão
fáceis. Nessa biblioteca-mundo nem sempre os personagens tem voz. Os olhos
castanhos machucam e procuram abrigo no país vizinho. Essa aventura danada
alguns por aí teimam em chamar de vida. Vida, cabeça, tacos de Lyon, nuvem
amarela, qual é a diferença? Enquanto o lápis toca o papel, os pássaros
voam cada vez mais longe, vão diminuindo no horizonte até se tornarem míseros
pontinhos que dói só de olhar.
A língua
emana traços insólitos de pensamentos não desenvolvidos. Os olhos castanhos
miran lejos. E a paixão lê, com calma, cada linha em cada esquina dessa
história de um lado só.
Um comentário:
Só agora descobri teu cantinho. Escreves lindamente, suave e macia como cafuné de mãe quando o filho volta pra casa. Não deixa teus leitores em abstinência e continue derramando doçura por aqui.
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